Dia da Mulher: breve análise acerca das mulheres minorizadas

1.   Introdução

A cada ano, no dia 8 de março, comemoramos o Dia Internacional da Mulher. No entanto, é preciso que este dia não passe em vão, sobretudo nesta sociedade, tal qual vivemos, com enraizamento ideológico profundamente machista. Daí a necessidade de existir este dia em nosso calendário civil.

            Para tanto, podemos emprestar o termo maioria minorizada, cunhado pelo professor Richard Santos, que inclusive dá nome à sua obra, publicada em 2020. Nesta obra, o autor apresenta uma análise atual acerca da racialidade, todavia, o mesmo podemos dizer a respeito das mulheres: é uma grande maioria na sociedade, no entanto, minorizada por uma parcela de misóginos.

Desse modo, propomos nesta breve análise, uma reflexão acerca da presença feminina que é vista com inferioridade, e a proposta do Dia da Mulher, portanto, surge para superar esta visão fragmentada, misógina, e totalmente desprezível.

 

2.   Mulheres na Filosofia

Na perspectiva da filosofia grega antiga, podemos destacar a importância de deusas próprias da mitologia, tais como, Ártemis, Atena, Afrodite, Deméter, Hera, Perséfone, Pandora, dentre outras. Todavia, mesmo por meio desta representação feminina quanto à mitologia, a mulher sempre foi bastante discriminada no meio pensante. Tanto que, para Aristóteles, a mulher era um homem não completo, pois, todas as características herdadas pela criança já estavam presentes no sêmen do pai, cabendo a mulher somente a função de abrigar e fazer brotar o fruto que vinha do homem. Esta forma de pensar foi propagada durante grande parte da Idade Média. Daí que, Tomás de Aquino, embora de ligações diretas ao pensamento aristotélico, rompe com este pensamento a ponto de dizer que, sendo a mulher moldada a partir das costelas de um homem (fundamentação bíblica), sua alma possuía a mesma importância que a de um homem.

Independentemente das opiniões de pensadores de determinadas épocas, o fato é que, a história da filosofia (em todos os períodos históricos) sempre contou com a presença de várias mulheres filósofas. Assim sendo, a grande questão está no fato de que elas tinham seu destaque reduzido ou inexistente em detrimento a sua condição de mulher. E, consequentemente, hodiernamente, nos grandes, médios ou pequenos centros universitários, não são, na maioria das vezes, sequer, mencionadas.

Em nível de curiosidade, temos, na Idade Antiga: Hipárquia de Maroneia; no Medievo: Heloísa de Paráclito (1101-1164) e Catarina de Siena (1347-1380); Modernidade: Teresa de Ávila (1515-1582), Harriet Taylor (1807-1858); Contemporaneidade: Rosa de Luxemburgo (1871-1919), Edith Stein (1891-1942), Hannah Arendt (1906-1975), Simone de Beauvoir (1908-1986), Ayn Rand (1905-1982). No Brasil temos Gilda de Mello e Souza (1914-2005), Lélia González (1935-1994), Marilena Chaui (1941), Sueli Carneiro (1950), Djamila Ribeiro (1980) – Colunista do Jornal Folha de São Paulo, e tantas outras que se encontram obscurecidas pela figura masculina no cenário educacional.

Vale ressaltar a grande importância, na gênese da Modernidade, da Princesa Elisabete do Palatinado (1618-1680). Ela foi – embora muitos estudiosos a desconheçam – a filósofa que trocava correspondência com René Descartes acerca de suas principais obras (obras essas que deram fundamento para a Filosofia Moderna). A capacidade intelectual de Elisabete era tão extraordinária que pôde criticar a metafísica dualista cartesiana e antecipar as preocupações metafísicas dos filósofos posteriores, o que chamamos hoje de Filosofia da Mente.

Enfim, é notório como as aparições de nomes femininos da História da Filosofia vão crescendo ao longo da evolução humana, e por isso, faz-se necessário, mais que nunca, rogar por este espaço que é próprio e de direito das mulheres da nossa época, e que, por sua vez, não podem ser desmerecidas. Cabe salientar também a acessibilidade da disciplina Filosofia, haja vista a racionalidade do ser humano e sua incrível capacidade de desenvolver o exercício da reflexão. Nesse sentido, o gênero, a etnia, a religião e a classe social não devem ser empecilhos para a prática filosófica, esta que deveria ser incentivada dentro e fora do ambiente educacional. Muito nos alegra saber que, em nossos dias, cresce o número de mulheres negras nas Universidades do Brasil, conforme recente publicação na Folha de São Paulo[1].

 

3.   O Dia Internacional da Mulher

Esta data comemorativa surgiu em meados de 1909, em Nova York (EUA), justamente como forma de manifestação a fim de obter igualdade de direitos civis na época, sobretudo o voto feminino. Ouvimos dizer que “dia da mulher é todo dia”, no entanto, o fato é que, se faz necessário um dia exclusivo para esta reflexão, e isto, em nada exclui a afirmação do adágio. Ademais, a mulher “exerce cada vez mais um papel de protagonista, embora ainda sofra com as heranças históricas do sistema social patriarcalista em seu dia a dia” (PENA, s.d.).

Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), os 12 direitos das mulheres são: Direito à vida; à liberdade e à segurança pessoal; à igualdade e à liberdade de todas as formas de discriminação; à liberdade de pensamento; à informação e à educação; à privacidade; à saúde e à proteção desta; de construir relacionamento conjugal e planejar sua família; de decidir ter ou não ter filhos e quando tê-los; aos benefícios do progresso científico; à liberdade de reunião e participação política; por fim, de não ser submetida a torturas e maltrato.

Outro aspecto que este dia nos leva a refletir é a violência. Embora existam leis específicas, como por exemplo, a “Lei Maria da Penha”, é mister destacar que as Delegacias da Mulher registram, ainda hoje, numerosos casos de agressões no ambiente domiciliar, assédio, estupro e assassinatos. Ademais:

Vamos tentar fazer um exercício de imaginar como vivem a maioria das mulheres brasileiras. Como vivem as mulheres das periferias das grandes cidades, as mulheres ribeirinhas do norte do país, as mulheres indígenas, as mulheres quilombolas, as mulheres camponesas? A grande maioria se encontra em trabalhos precarizados, sem carteira assinada, sem muita escolarização, sem assistência do Estado, muitas, nem mesmo documentação possuem. Mulheres, meninas, negras, pobres, indígenas, ribeirinhas, camponesas, largadas à própria sorte. Sorte? Destino? Ou, sistema capitalista, racista, patriarcal, desumano, cruel, injusto? Que explora, divide a sociedade e as pessoas em diferentes classes. Expostas a todo tipo de violência, opressão, exploração, apropriação. (KALSING, 2021, s.p.).

 

4.   Considerações Finais

Posto isto, a proposta de celebrar o Dia Internacional da Mulher, quer evidenciar uma urgente e necessária mudança de mentalidade na sociedade em geral. Ora, valorizar a mulher não significa, necessariamente, desvalorizar o homem, mas sim, dar a devida dignidade a ambos. Para isto, há projetos sociais espalhados pelo mundo. O que não podemos é terceirizar isto, ou seja, achar que somente tais projetos possuem responsabilidade, e, por conseguinte, nós, nada podemos fazer.

Ao contrário: nós devemos ser a mudança! Homens e mulheres que superem as diferenças irracionais (etnia, gênero, etc.) presentes no pensamento cultural hodierno. Sem tal mudança, no entanto, o dia 8 de março é, simplesmente, um dia como qualquer outro, sem quaisquer tipos de reflexão e ações que gerem mudança. É papel de todos: cidadãos, religiosos, ateus, adultos e crianças. Todos!

 


Referências

ALMEIDA, D. S. Maioria minorizada: subvertendo a ideia de minoria atribuída à população negra. Revista Espaço Acadêmico, v. 21, n. 230, p. 393-395, 1 set. 2021.

GRUPO IBERDROLA. O papel da mulher hoje: um reconhecimento àquelas que abriram caminho para as mulheres de hoje. Disponível em: <https://www.iberdrola.com/compromisso-social/o-papel-da-mulher>. Acesso em 05 de mar. de 2022.

PENA, Rodolfo F. Alves. A importância da mulher na sociedade; Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/geografia/a-importancia-da-mulher-na-sociedade.htm. Acesso em 05 de março de 2022.

KALSING, Vera Simone Schaefer. A real situação das mulheres hoje; O tempo. Disponível em: < https://www.otempo.com.br/opiniao/artigos/a-real-situacao-das-mulheres-hoje-1.2455373>. Acesso em 05 de mar. de 2022.



[1] Disponível em: < https://www1.folha.uol.com.br/educacao/2021/08/mulheres-negras-sao-hoje-maior-grupo-nas-universidades-publicas-do-pais.shtml>.

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