A superação do Natal

--- A SUPERAÇÃO DO NATAL ---

 

“O Senhor está perto dos que têm o coração quebrantado e salva os de espírito abatido”

(Sl 34, 18)

 

Estamos caminhando para o fim do ano, e com ele, nos preparamos para celebrar o Natal do Senhor. Natal é luz; Natal é alegria; Natal é esperança. São afirmações otimistas e, talvez, um tanto quanto inapropriadas para se usar no findar deste ano de 2022. Apenas para pontuar, além das mais de 692 mil mortes por Covid-19 no Brasil, 9% da população brasileira está desempregada, a taxa de suicídios aumenta a cada dia, os crimes, acidentes e tragédias estão acima da média; famílias, política e grupos estão divididos etc. Ademais, a desigualdade social está mais expressiva que o comum: são famílias que não têm condições para comer o mínimo necessário, realidades sem saneamento básico, falta de acesso aos estudos básicos, bem como a precariedade de saúde pública. 

Sendo assim, como poderemos cear em família, sendo que pode estar faltando algum membro que se foi nos últimos anos, com tanta gente passando fome enquanto outros esbanjam alimentos, ou com crianças, jovens, homens, mulheres e LGBT's sendo mortos simplesmente por serem como são? Onde está a luz? Onde está a alegria? Onde está a esperança? Todas estas questões nos remetem à uma questão ainda mais provocante: como nós, cristãos, devemos nos portar diante dessas situações?

------

A nível de informação, a palavra “natal”, em português, deriva do latim: “nātālis, que por sua vez, deriva do verbo nāscor, que significa nascer. É, portanto, celebrado o nascimento de Jesus Cristo. Assim, todo o mistério gira em torno de um menino que, encarnado em nosso meio, é símbolo de humildade e sabedoria, mas também de tumultos, revoltas, e, sobretudo, de redenção. Aqui está a chave de leitura para compreendermos o verdadeiro mistério natalino.

“Todo menino quer ser homem. 

Todo homem quer ser rei. 

Todo rei quer ser Deus. 

Só Deus quis ser menino.”

(Leonardo Boff)

Ora, é claro que não temos razão de celebrar o Natal, depois de tanto dissabor ao longo do ano, se o sentido estiver nas luzes, na alegria e no consumo que o sociedade apresenta. Acontece que, a celebração natalina, na sua essencialidade, está intimamente ligada à Paixão de Cristo. Sim, celebramos a encarnação de Cristo, mas para uma finalidade: a nossa redenção, que por sua vez, se deu pela paixão, morte e Ressureição. Vejamos, irmãos, é um mistério completo e amável: “Deus amou tanto o mundo que deu o seu filho amado” (cf. Jo 3, 16).

Ademais, já sabemos que as marcas da cruz permanecem no Jesus Ressuscitado, por isso, não esqueceremos as tristezas existentes no mundo, não esqueceremos os parentes, amigos e benfeitores que tiveram suas vidas ceifadas, mas, acima de tudo, é preciso que apresentemos estas chagas ao Senhor, de modo que sejamos renascidos com elas e por elas, pois, se o natal é nascimento do Menino-Deus, é o nosso nascimento também: como novas pessoas, novos cristãos, isto é, como verdadeiros filhos amados de Deus.

É preciso, portanto, que tenhamos total consciência da nossa missão no mundo, de modo que, mediante as dores e labutas do Calvário, almejemos o valor da Ressureição gloriosa, pois, “onde abundou o pecado, superabundou a graça”(cf. Rm 5, 20), pois, “espinhos são meros detalhes para quem se encanta com a flor” (Sirlei L. Passalongo).

Para isso, o Senhor nos diz: “vai, e livra Israel. Sou eu que te envio.” (cf. Jz 6, 14). E muito nos assemelhamos a Gedeão, neste trecho bíblico. Estando Gedeão sentado debaixo de um carvalho, apareceu-lhe um anjo dando-lhe coragem para seguir a sua missão. No entanto, mesmo diante de palavras consoladoras, Gedeão foi capaz de murmurar chegando a dizer que Deus havia o abandonado. Em suas palavras: “se o Senhor está conosco, peço-te, Senhor, que me digas por que nos aconteceu tudo isto? Onde estão aquelas tuas maravilhas que nossos pais nos contaram, dizendo:' O Senhor nos tirou do Egito'?” (cf. Jz 6, 13).

Esquecemo-nos facilmente dos feitos divinos em nossa vida quando qualquer vento contrário chega em nossa existência, porque os nossos alicerces estão na areia, e não na rocha, que é Cristo. Irmãos, retornemos às origens. É o que nos falta: entender e viver o verdadeiro sentido do Natal. Natal é vida, mesmo que seja a nossa vida: frágil, sofrida e dolorida; mas é vida que temos, ao mesmo tempo, que é uma vida renascida por Cristo, com Cristo e em Cristo.

Neste Natal, espalhemos sorrisos, ofereçamos abraços, sejamos luzes, alegria e esperança para os outros, porque Cristo é luz, alegria e esperança por todos nós! Não busquemos fora o que está dentro, porque “o nosso coração tem um vazio do tamanho de Deus” (Santo Agostinho).

“Chegou o dia de ela dar à luz, e teve o seu Filho primogênito” (Lc 2, 7). É confortante saber que o Messias esteve presente em nosso meio, pisando por essas terras, realizando milagres e perdoando pecados. Deus é tão amoroso conosco, que deu seu Filho único em justificação dos nossos pecados, porque “se o homem caiu miseravelmente, Deus desceu misericordiosamente” (Santo Agostinho).

Nesse sentido, a mistagogia do Natal nos remete a uma reflexão de vida, isto é, mudança de sentimentos e atitudes. Jesus encarnado que nasceu numa manjedoura, em Belém da Judeia, a cada natal nasce de novo em nosso coração. Para tal, é preciso que estejamos fieis aos conceitos evangélicos, abertos aos propósitos da santidade e dispostos a dizer como Maria na anunciação: “Eis aqui o teu servo, Senhor, faça em mim a tua vontade” (cf. Lc 1, 38).

Estar a disposição de um Deus que se faz próximo é reafirmar também o nosso compromisso de fazer-nos próximos aos irmãos necessitados. Natal é tempo de esvaziar-se de si mesmos, para encher-se de Deus através dos irmãos. Por isso, egoísmo e consumismo não devem existir em nossas comunidades. Quantos irmãos temos visitado? Quantos pobres temos ajudado?

Enfim, o Natal nos traz um profundo sentido da vinda de Deus, que trouxe a certeza de que Ele não somente conduz a história da humanidade, mas também, participa dela, caminhando ao nosso lado. É, verdadeiramente, o Deus-conosco, Emanuel (cf. Mt 1, 23). Portanto, façamo-nos também próximos uns dos outros.

É Natal de amor;

de Deus encarnado

pois é ele chamado

de Cristo, Senhor.

 

É Natal de amor;

de filhas e filhos

que vivem nos trilhos

do Deus reconciliador.

 

É Natal de amor;

de cristãos encarnados

na realidade dos fracos

para valer seu louvor.

 

É Natal de amor;

do Deus pequenino

que está no menino

mas também no senhor.

 

É Natal de Jesus

que nas trevas é luz.

Que se faz um de nós

e para o céu nos conduz.

 

Um feliz e abençoado Natal a todos. Santo 2023!

Fraternalmente,

Luis Gustavo da Silva Joaquim.






Comentários